quarta-feira, julho 24, 2002
RADIOHEAD IMPARÁVEIS NO SEGUNDO CONCERTO LISBOETA
Na segunda noite em Lisboa, os Radiohead trocaram as voltas. Tocaram durante mais de duas horas, sem intervalo, e avançaram com mais temas novos intercalando-os com as canções antigas. Os fãs adoraram. A banda, suada e contente, retribuiu. E hoje há mais.
Quem foi ontem à noite ao Coliseu dos Recreios, em Lisboa, estava à espera de um concerto em duas partes distintas, divididas por um intervalo de vinte minutos. A primeira seria apenas composta por material inédito e a segunda traria os inevitáveis bombons aguardados há vários anos. Nada disso.
Mudança de planos. O grupo de Thom Yorke fez apenas dois pequenos intervalos (cinco minutos) e manteve-se em palco durante duas horas meia: suada e contente. Sim, contente. E este é um dos pontos realmente positivos de assistir a um concerto de uma banda com o gabarito de uns Radiohead: a entrega, garra, simpatia e profissionalismo deste quinteto britânico é de louvar.
É bom saber, especialmente depois de ter ouvido várias mensagens desagradáveis (na voz de Paul Godfrey dos Morcheeba e, mais tarde, pelos MC´s dos Gorillaz) dirigidas ao público português durante o evento "Isle Of MTV" ("a MTV está na vossa cidade, façam barulho!", "vocês são piores que os alemães", e pior ainda, "mostrem algum respeito"... olha quem fala), que afinal as coisas não são bem assim.
Isto porque os Radiohead percebem que um bom concerto acontece da simples troca entre quem está no palco e quem está na plateia. E se uma das partes não está interessada na comunicação (seja ela através da palavras, dos gestos, de um olhar, um esboço de sorriso, uma brincadeira...) não há muito que se possa fazer.
E o público também soube estar, emocionado ao rubro mas comedido, com silêncios.
AS CANÇÕES
A noite de ontem foi inesquecível. Uma descarga verdadeiramente alucinante de música abençoada invadiu o Coliseu dos Recreios, que não estava a rebentar pelas costuras, como na noite de 2ª feira.
Todos foram para presenciar que o futuro existe, um futuro que começou por passar por uma reclusão, quando a banda de Thom Yorke se fechou em si.
Há que frisar que os temas inéditos são mais imediatos que os seus antecessores (de "Kid A" e de "Amnesiac"). Compostos por melodias simples e fáceis de cantarolar, estas canções (mesmo) devem querer dizer um novo volte-face no som dos Radiohead. A ver vamos até porque o próximo álbum só deverá sair no próximo ano. Mas está garantido que o próximo álbum é, novamente, composto por emoções fortes que pairam num universo entre o paraíso e o inferno. Um pouco à semelhança do que se deve passar na mente impenetrável de Thom Yorke.
Foi para ouvir o resultados dos anos de clausura que se encheu ontem o Coliseu. Aliás este nome é já sinónimo de enchentes, de lotações esgotadas. E Portugal não é excepção. Ficaram para trás os concertos de 97, quando a banda, prestes a editar "OK Computer", actuou durante três noites para os (poucos) que os quiseram ir ver ao Paradise Garage, em Lisboa.
A coisa aconteceu aos poucos. Para saborear com tempo a curiosidade e a reacção dos presentes. "There There", uma das novas canções, abriu a noite acompanhada pela explosão de alegria do público. O tema ganhou uma força catalisadora ao contar conta com os guitarristas Ed O'Brien e Jonny Greenwood nos timbalões (de bateria).
Depois a noite passou por "Scatterbrain", "We Suck Young Blood", "Strangely Enough", "Sail (You) To The Moon", "Myxomatosis", "The Punch Up At The Wedding" e "Keep The Wolf From The Door".
E quando todos pareciam precisar de um momento de pausa, ela surge com "Lucky", e logo depois, "I Might Be Wrong" (de um rock electrizante), "Morning Bell", "Fake Plastic Trees" e "Karma Police" (momento para todos cantarem em coro).
Ao longo de mais de duas horas desfilaram ainda "Cuttooth", "The National Anthem", "Climbing Up The Walls", "Pyramid Song" (um dos momentos de maior intimismo), "Paranoid Android", "Idioteque" (sem dúvida um dos pontos altos da noite com a sala inteira aos pulos ao assistir a ininterruptas descargas sónicas enfatizadas por um jogo de luzes irrequieto).
Para terminar foram esolhidas "Everythig In Its Right Place", "Street Spirit" e o inevitável "How To Disappear".
O SALDO
Para uns, eles são geniais. Para outros, são chatos. Uma coisa é certa, os Radiohead romperam convenções. Particularmente nos últimos anos, em que a banda se concentrou na actividade criativa, muitas vezes ameaçada de "impotente" tal como aconteceu após "OK Computer", cuja força musical se pensava insuperável. Que pesado fardo. Um disco elogiado pela maior parte da imprensa como o melhor álbum de toda a década de 90.
Poder-se-ia mesmo dizer que a música dos Radiohead é um exemplo franco de como a emoção supera a máquina.
Teresa Salomé
Voxpop, 24 Julho 2002
salamandrine 12:06
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